domingo, 18 de agosto de 2013

Irreversível: Vingança e Machismo



Filme francês de 2002 dirigido por Gaspar Noé (We Fuck Alone), com Vincent Cassel (Marcus), Monica Bellucci (Alex) e Albert Dupontel (Pierre).
O filme narra uma história de vingança de trás para frente protagonizada por Marcus e Pierre. Alex, namorada de Marcus foi estuprada e brutalmente espancada. Na primeira cena vemos os dois amigos desesperados atrás do criminoso. O que vem a seguir são os fatos que os levaram àquele ponto.
Fazia tempo que precisava ver este filme, mas por questões pessoais não consegui. Como já devem saber, há duas cenas fortemente violentas: a cena em que Pierre atinge o rosto do estuprador com um extintor de incêndio e a tão famosa cena de Alex sendo estuprada. Esta é uma longa sequência em que nenhum telespectador (mesmo os que têm nervos de aço) consegue sair imune diante de tanta barbárie cometida contra uma mulher.
Finalmente consegui me desfazer do que me impedia de assisti-lo. Este filme sempre esta na lista dos mais violentos, dos mais chocantes, etc. Portanto, mesmo tendo achado o filme razoável, não aconselho às pessoas mais sensíveis, mesmo achando que às vezes você precisa se deparar com o que você acha que esta distante de você, mas não esta. Uma mulher pode estar sendo atacada ao lado da sua casa enquanto você assiste a saga "Crepúsculo".
Já no início nos deparamos com os créditos finais de trás para frente, e em seguida vem Gaspar Noé com sua câmera girando em torno de Marcus e Pierre, o jogo de luzes que às vezes causam certo incômodo. Aliás, me parece que Gaspar Noé gosta de brincar com câmeras e luzes. No curta-metragem "We Fuck Alone" há até uma advertência para que pessoas epiléticas não o assistam justamente por esta razão.
Não assisti "We Fuck Alone" por considerar o curta machista quando foca justamente na masturbação masculina, e particularmente não estava interessada em assistir um garoto que se masturba com uma boneca inflável. É por isso que quando me descrevo para o blog digo: "não me considero cinéfila", entendo como "cinéfilo" quem assiste de tudo, e devo confessar que sou bastante seletiva nas minhas escolhas.
Irreversível não é um grande filme, e esta longe de ser uma obra-prima como já vi muitos comentários. Não há nada de inovador no roteiro e sei que serei crucificada por isso porque o filme tornou-se um verdadeiro cult.
Se formos analisar friamente a obra o que temos? Um homem que quer vingar o estupro da sua mulher. É só isso. Gaspar Noé usou um assunto clichê para chocar e confundir a plateia com as cenas de violência explícita e a história de trás para frente. Não vi nenhum mérito nisso, portanto, utilizo uma expressão ainda mais clichê que o filme: superestimado.
E como se não bastasse o roteiro fraco, uma mesmice, Gaspar Noé coloca o machismo ali nas entrelinhas para que os telespectadores menos desatentos não percebam. E de fato não percebem porque tudo que o sadismo cinéfilo pede é para ver Monica Bellucci sendo estuprada e espancada por quase dez minutos. Talvez por isso essas nuances tenham passado despercebidas.


Onde esta o machismo? Ora, em um diálogo entre Alex, Marcus e Pierre (que foi namorado de Alex), Marcus e Pierre começam a comentar sobre a intimidade que cada um teve com Alex, objetificando-a, enquanto ela ri e começa a orientar sexualmente Pierre sobre como ele deveria agir com as mulheres, e Marcus não se importa. Esta cena inclusive foi rodada dentro de um metrô, enquanto os três estavam indo para uma festa e Alex vestia uma blusa por cima do vestido. Quando ela vai embora da festa, cadê a blusa? Seria erro de gravação?
Os três chegam na festa e Marcus parece um adolescente. Deixa a namorada sozinha, cheira cocaína, beija outras mulheres, enquanto Pierre pede para que ele não faça aquilo. Marcus pouco se importa com sua namorada, tudo era diversão e em uma conversa com Alex, os dois começam a discutir e ela vai embora irritada e sozinha.
Aí volto na cena inicial quando Pierre e Marcus saem da festa, e Pierre demonstra uma certa preocupação com Alex e Marcus diz: "deixa pra lá, eu dei dinheiro para o táxi " Sem falar que a personagem de Bellucci é a típica mulher apaixonada e sonhadora, sensível, mas isso não é justificativa para aceitar as infantilidades do namorado.
Quando Alex entra no túnel para pegar o metrô, as cores mudam. As paredes ficam vermelhas, luzes piscando e nós já sabemos o que irá acontecer. Sim, sentimos vontade de impedir que Bellucci continue seu trajeto, mas ela é surpreendida com um homem espancando uma mulher. Quando tenta fugir, o predador a pega, e é aí que começa a tortura dela e a nossa.
Não desmereço a cena de violência, acredito que ela foi necessária. Como escrevi no início, às vezes precisamos entrar em contato com o que aparentemente esta longe da nossa realidade para que possamos pensar, refletir. E é exatamente isso que acontece, embora seja brutal e deprimente, não vamos ser hipócritas. O filme só alcançou certa fama porque tem uma mulher sendo explicitamente violada. As pessoas querem ver isso por diferentes razões: há os onanistas de plantão, há quem gosta realmente de filmes com esta temática, e há quem prefere refletir sobre tudo que aconteceu. Por exemplo, enquanto Alex estava naquele martírio, lá no fundo do corredor aparece um homem, e ele foge. Você o que faria se visse uma mulher sendo agredida na sua frente?
Outro ponto que podemos questionar é sobre a sede de vingança de Marcus. Ele estava tão obstinado que eu realmente não sei se o que ele queria era fazer justiça, ou se era novamente o machismo gritando, afinal, um desconhecido transou com sua mulher. É claro que há a revolta, o desespero, mas confesso que não pude definir muito bem a personalidade de Marcus.
Para mim, o grande mérito mesmo foi de Monica Bellucci por sua interpretação como a vítima da violência. Imagino que não deve ter sido fácil gravar esta cena, e mais ainda para uma mulher ter que transmitir tamanho sofrimento.
Depois de assistir ao filme, a pergunta que fica é: a vingança vale mesmo à pena? Quem saiu ganhando afinal?

Cotação: 3 estrelas

5 comentários:

  1. Eu adoro as suas críticas! Como estou cansada de cinéfilos/cults sei lá o que se acabando de falar bem de um filme que tem como único diferencial a violência explícita. Tem gente que não consegue distinguir o choque pra causar uma reflexão e o choque apenas pra chocar. Enfim, gostei muito do que foi dito. Tem muito bom senso!

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    1. Muito obrigada por sua visita ao meu blog. Confesso que quando escrevi sobre Irreversível, esperava que fosse bombardeada porque sei que é um filme cultuado.
      Espero que volte mais vezes!
      Um grande beijo!

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  2. Parabéns pela crítica! Demorei muito prá ver Irreversível também e pelos comentários em sites como filmow, notei pelos comentários que ninguém cita o machismo do filme. Senti muita repulsa na frase onde Alex diz que o prazer do homem é o prazer da mulher, ou seja, deixando mais que claro que a mulher tem que se contentar com o gozo do teu parceiro, deixando teu prazer em segundo plano. Isso sem contar outros pontos que já foram citados por você, como o caso da 'propriedade', vou vingar o estupro não por ser mulher, mas por ser um homem com a 'honra manchada'.

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    1. Obrigada Jenny Justino pelo comentário! E obrigada por gostar da crítica!
      Abraços!

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    2. Olá Lidiana. Li sua crítica a respeito do filme. Estava procurando algo para uma amiga ler sobre o filme e acabei aqui.

      Achei interessante o seu cuidado em perceber que há uma cena em que a protagonista não aparece com uma blusa que anteriormente estava e não ter se dado conta do que de fato tem a ver com a narrativa e que dá nome ao filme.

      Você e todos aqueles que leram sua crítica pois ninguém a mencionou.

      Talvez o que você tenha deixado passar e que lhe pareceu apenas uma simples vingança, na realidade é de fato o que dá sentido ao filme que você não achou lá essas coisas; o sujeito que foi morto no início do filme não foi o que praticou o estupro, ou seja, a vingança de fato aconteceu com o sujeito errado.

      Irreversível, se você o vir novamente, poderá quem sabe te dizer algo?

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