sábado, 27 de abril de 2013

Moolaadé - 2004



Em uma aldeia africana, seis garotas fogem do "ritual de purificação" que seria a mutilação do clitóris, duas se suicidam em um poço local, e as outras quatro buscam abrigo na casa de Collé, uma mulher que não permitiu que sua filha fosse mutilada. Tentando proteger as meninas, Collé clama por Moolaadé ( proteção sagrada), e para isso terá que enfrentar toda a aldeia e até mesmo a violência de seu marido. Filme africano dirigido por Ousmane Sembene (A Negra de...)
Devo dizer que este filme foi ricamente construído pois consegue colocar o telespectador em contato com outra cultura sem que isso se torne enfadonho ou algo parecido. Nós vemos uma pequena aldeia com suas próprias leis, onde o machismo e as superstições imperam, mas apesar de toda a precariedade do local, as mulheres procuravam se manter informadas através dos seus rádios.
Particularmente gostei desse filme por dois motivos. O primeiro por abordar um assunto tão horrível que é a mutilação clitoriana, e que acontece em alguns países da África e Ásia. Ao contrário do que muitos pensam, este é um costume tribal e nada tem a ver com religião. E por que é tão horrível? Porque priva a mulher de ter uma vida sexual saudável, ela tem seu clitóris amputado, é impedida de sentir prazer, isso para garantir um marido, garantir a castidade e garantir que seja fiel ao marido.


Segundo porque achei o filme bastante feminista. São as mulheres que vão lutar contra a mutilação e desmistificar que esta prática é uma imposição do Islamismo, mesmo que para isso elas tenham seus rádios confiscados pelos homens em uma típica tentativa de alienar suas mulheres e fazer valer a força masculina.
Collé: mulher de fibra que enfrenta as tradições para salvar sua filha e as quatro garotas. Deixa-se chicotear pelo marido na frente de toda a aldeia e mesmo assim se mantém firme na decisão de não retirar o Moolaadé, ganhando o respeito das mulheres da tribo e por que não dizer, o meu também?


Muitos podem dizer que esta prática é cultural, e de fato é. Mas não podemos nos esquecer que muitas meninas morrem, sendo assim, tudo que provoca sofrimento alheio precisa e deve ser mudado. Acredito que o filme de Ousmane Sembene seja um grito em nome de todas as mulheres mutiladas, e mais ainda! Um alerta para que o mundo volte seu olhar para uma região tão esquecida como a África.


"Nenhuma menina será mais cortada!"

terça-feira, 23 de abril de 2013

Pariah - 2011



Trama dirigida por Dee Rees  e que conta a história da adolescente Alike (Adepero Oduye), moradora do Brooklin e que tenta de todas as maneiras esconder sua homossexualidade dos pais ( Kim Wayanes e Charles Parnel) . A única pessoa que sabe seu segredo é sua melhor amiga Laura (Pernell Walker)  que também é lésbica e por essa razão, a mãe desaprova esta amizade. Juntas, as duas frequentam boates GLS na esperança de que Alike encontre uma namorada. Filme vencedor do festival de Sundance 2011.
Obs: Pariah = uma pessoa sem status, um membro rejeitado pela sociedade. 

"Para onde voava o pássaro sem patas, encontrava árvores sem galhos."
Andre Lorde

É com esta citação que começa o filme Pariah. E em seguida vemos Alike e Laura em uma boate GlS, Alike vestida de menino, feliz, sentindo-se livre, mas ao mesmo tempo apreensiva, pois queria conhecer alguém. O tempo passa, Laura e Alike precisam ir embora, Alike se veste de menina dentro do ônibus, nesta cena já podemos concluir que os pais não aceitam a homossexualidade da filha.
Li muitos comentários à respeito desse filme e um deles é que as lésbicas ficaram estereotipadas. Discordo completamente dessa afirmação, pois o que vemos é uma adolescente de 17 anos lutando para viver sua sexualidade, a não aceitação da família, o preconceito que ela e outras garotas sofrem no bairro, isso não é estereotipo, é a realidade de muitos jovens retratada na tela dos cinemas.
Um outro fator que merece destaque, é a aproximação de Lee (Alike) e uma amiga do colégio. É claro que a garota sabia que Alike era lésbica, e se aproveitou disso para brincar, ou para matar sua curiosidade (isso é só uma hipótese minha), já que a garota foi totalmente indiferente no dia seguinte, sem se importar com os sentimentos de Alike, apenas diz: "Não conte para ninguém."
E podemos dizer que isso acontece? Sim podemos. Com tantas declarações de famosos que se dizem bissexuais, parece que que virou modinha entre os jovens experimentar de tudo, ser de todo mundo e dane-se o resto! Nada contra os bissexuais! Pelo contrário! Sei perfeitamente que é possível sim um homem ou uma mulher sentir atração pelos dois sexos, mas o que questiono aqui é a banalização. A garota dormiu com Alike em uma noite e no outro dia estava com um menino! E disse ainda: "Eu não sou gay!"
É claro que isso provocou um caos em Alike, afinal era sua primeira experiência, para ela foi verdadeiro, foi entrega total, e não só um passatempo.
A mãe esta sempre preocupada em vestir sua garotinha como menina e garantir que ela ande com companhias femininas. O pai é relapso, sabe da homossexualidade da filha, mas não quer aceitar. Afinal, ele é um policial, e isso seria vergonhoso, não? Ele não suporta a esposa com seus fundamentalismos, ele a trai, até sentimos raiva dele, mas é este homem quem estenderá a mão para Alike no momento em que ela mais precisará.


"Não há nada de errado comigo."

Lee além de corajosa é uma grande escritora, e fez sua escolha. Isso exigiu que ela atravessasse um caminho  árduo, mas escolhas exigem sacrifícios, exigem renúncias, exige coragem.


"Diga a mamãe que Deus faz as coisas certas."

sexta-feira, 5 de abril de 2013

Orações para Bobby - 2009 : Meu protesto contra Marco Feliciano!




Orações para Bobby conta a verdadeira história de Mary (Sigourney Weaver), uma mãe de família religiosa, que se sente abalada quando seu filho Boby (Ryan Kelley) revela ser gay. Começa então uma corrida na tentativa de "curar" Bobby, no entanto, depois de se culpar por ser quem era, Bobby se atira de uma ponte aos 20 anos de idade e Mary começa a refletir sobre seus próprios conceitos até se tornar uma militante da causa gay. Filme dirigido por Russell Mulcahy (O Escorpião Rei: A Saga de um Guerreiro)
Assisti esse filme já tem um certo tempo. Embora tenha sido feito para a TV, a atuação de Sigourney Weaver não passa despercebida, foi simplesmente tocante. Não é um grande filme, mas é uma grande história, e em tempos de Marco Feliciano nada mais sensato que escrever sobre uma trama com temática GLS.
Eu poderia ter escolhido outro filme, há muitos filmes bons com temática GLS. Mas lembrei-me deste quando li um comentário de uma moça com relação a uma matéria da revista Época, que dizia que Feliciano insiste em dizer que os negros são amaldiçoados, e entre tantos comentários dos leitores, é claro que suas declarações homofóbicas vieram à tona. E a moça escreveu mais ou menos assim: "toda mãe sonha que o filho se case de forma tradicional, tenha filhos, eu não sou homofóbica!" Me pus então a refletir sobre o que ela escreveu, e imediatamente Orações para Boby me veio à mente.
Bem, no filme, assim como na realidade, Mary sonhava exatamente isso para Boby, mas não era isso que ele sonhava. E ele tentou seguir à risca a cartilha da mãe, mas isso só gerou tristeza, infelicidade, depressão, e um fim trágico. Então, fica a pergunta: os pais querem que os filhos sejam uma extensão deles mesmos, ou que tenham vida própria e sejam felizes?
Mesmo com os leitores já sabendo o final do filme, ele não termina aí. Com a morte de Bobby, Mary vê a chance de recomeçar, de entender o filho, e para isso ela terá que quebrar seus próprios paradigmas. Uma luta consigo mesma, com aquilo que acreditou a vida inteira e sobretudo com seu amor de mãe.
Esta história aconteceu na década de 70, mas acontece ainda nos dias de hoje. Basta ver as declarações de Feliciano, Joelma (nossa como Joelma me lembrou essa mãe!) Nos coloquemos no lugar dos homossexuais, como eles se sentem tendo seus direitos violados, sendo motivo de escárnio para toda a sociedade? Como você se sentiria?
Mais resenhas sobre filmes com temáticas gay virão. Então, se você é homofóbico ou algo do gênero, me faça um favor: não leia este blog.



"Eu não posso deixar ninguém saber que não sou hétero. Isso seria tão humilhante. Meus amigos iriam me odiar, com certeza. Eles poderiam até me bater. Na minha família, já ouvi eles falando várias vezes que odeiam gays, que Deus odeia os gays também. Isso realmente me apavora quando escuto minha família falando desse jeito, porque eles estão realmente falando de mim. Às vezes eu gostaria de desaparecer da face da terra...Às vezes sofro tanto...Estou assustado e sozinho. Estou condenado. Estou afundando lentamente num vasto lago de areia movediça. Um poço sem fundo. Gostaria de rastejar para debaixo de uma pedra e dormir para sempre. [...] Posso sentir os olhos de Deus olhando para mim com pena."

Trecho extraído do diário de Bobby.


Esta é a verdadeira Mary em uma parada gay.

segunda-feira, 1 de abril de 2013

L'Apollonide: Os Amores da Casa de Tolerância - 2011



Um famoso bordel da França do final do século XIX vive seus dias de decadência. No entanto, é nesta casa que muitos homens vão buscar refúgio nos braços de belas mulheres, que se dispõem a tudo para agradar seus clientes. Trama dirigida dirigida pelo francês Bertrand Bonello.
Primeiramente devo dizer que na filmografia de Bertrand Bonello só consta L'Apollonide, e se minha pesquisa estiver correta, Bonello revela-se como um dos melhores diretores e roteiristas desta década.
L'Apollonide - Os Amores da Casa de Tolerância poderia ser mais um filme sobre prostituição, mas não é. A trilha sonora é simplesmente fabulosa, o figurino é impecável e a fotografia é belíssima.


Também devo fazer uma crítica ao site Sonata Première ( esse é o blog que uso para baixar a maioria dos filmes), que qualificou o filme como "erótico", e de erótico ele não tem absolutamente nada. Trata-se de um drama muito bem construído acerca das belas prostitutas desta casa de tolerância que sonham encontrar um cliente que pague suas dívidas para que elas possam sair e ter outra vida. Sim, elas sonham com outra vida, apaixonam-se pelos clientes, choram por eles, mesmo sendo submetidas às mais constantes humilhações.
Essas mulheres eram escravas. Precisavam estar sempre limpas, perfumadas, e entre um cliente e outro sempre havia um ritual de higiene. Algo que cansa só de olhar, mas elas tinham que estar sorridentes, dispostas a tolerar 3, 6 clientes em uma noite. A personagem que melhor representa toda essa tristeza travestida de alegria é Madeleine, que após confiar cegamente em um cliente que conhecia há anos, acaba ficando famosa como "a mulher que ri", uma metáfora perfeita para o riso forçado, o choro contido.
A amizade que se forma entre elas é algo comovente. Até mesmo a cafetina não tem aquela figura malévola e exploradora que estamos acostumados a ver. Ela cobra as dívidas das garotas, mas preocupa-se com elas, não as trata mal, mas é exigente quanto à higiene e saúde das meninas.


As casas de tolerância não existem mais. Não com o requinte e glamour do século XIX. Então, onde foram parar as prostitutas? Conseguiram elas ser livres? O que mudou do século XIX para o século XXI? Esses são alguns questionamentos que podemos fazer sobre essas mulheres que sempre viveram à margem da sociedade.


"Se eu sair daqui, nunca mais faço amor"